PESSACH

Posted on abril 14, 2017

PESSACH

Estações do Amor

Shir HaShirim (que será lido na tarde do Shabat chol hamoed Pessach) não é o único livro bíblico sobre o amor. O amor é uma emoção complexa que não pode ser definida a partir de uma única perspectiva – nem todas as suas dimensões tornam-se aparentes ao mesmo tempo. De uma maneira que é sutil e ricamente complexa, Shalosh Regalim, os três festivais de peregrinação, têm seu livro especial, cada um sobre o amor e sobre as diferentes fases do mesmo.

Shir HaShirim, o Cântico dos Cânticos, em Pessach, é sobre o amor como paixão. Os amantes são jovens. Não há menção de casamento, uma casa, filhos, responsabilidades. Eles não têm em mente o amanhã nem os outros. Eles estão obcecados um com o outro. Vivem conscientes da ausência do outro, desejando a sua presença. É como o amor deveria ser parte do tempo, enquanto é para ser profundo e transformar o tempo todo.

O livro de Rute, o pergaminho que lemos em Shavuot, é sobre o amor como lealdade: a lealdade de Rute à sua sogra Naomi e de Boaz a Naomi, Rute e a herança familiar. Trata-se de “bondade amorosa”, a palavra inventada por Myles Coverdale em sua tradução da Bíblia de 1535 – porque ele não conseguiu encontrar nenhuma palavra em inglês que significasse chessed. Começando com a morte, o luto e a ausência de filhos e terminando com o casamento e o nascimento de uma criança, trata-se do poder do amor para redimir a dor e a solidão e “tornar gentil a vida deste mundo”. Trata-se do que Shir HaShirim não é: sobre o casamento, a continuidade e a fé com “os vivos e os mortos” (Rute 2:20). Isso também, no judaísmo, é uma parte significativa do amor, pois não somos apenas nós mesmos: fazemos parte da cadeia viva das gerações.

Em Sucot temos uma terceira história sobre o amor: o amor envelhecido e sábio. Kohelet, Eclesiastes, é um livro fácil de ser mal interpretado como um estudo de desilusão. Isso se deve a uma série de traduções mal feitas de sua palavra-chave, hevel. É entendido como “vaidade, sem sentido, fútil, inútil”, levando os leitores a pensar que seu autor considera a vida sem propósito ou objetivo. Hevel não significa isso: significa “uma respiração fugaz”. Trata-se da brevidade da vida na terra. Começa com o autor buscando a felicidade na filosofia (chochmá), o prazer, o riso, o acúmulo de riquezas, as belas casas e os jardins de prazer, as eternas tentações seculares. Ele descobre que nada disso pode derrotar a morte. Os objetos duram, mas aqueles que os possuem não. A sabedoria pode ser eterna, mas os sábios ainda morrem.

Nós derrotamos a morte não por uma busca da imortalidade neste mundo, mas por simchá, a alegria espiritual e moral sobre a qual William Blake escreveu: “Aquele que se liga a si mesmo com alegria / A vida alada destrói / Aquele que beija a alegria enquanto voa / Vive no sol da eternidade”. Kohelet descobre que a felicidade deve ser encontrada não no que você possui (liga a si mesmo), mas no que você compartilha. Não existe onde você investe seu dinheiro, mas onde você dá de si mesmo. Vive no trabalho e no amor: “Aprecia a vida com a mulher que amas todos os dias desta efêmera vida que te foi dada sob o sol, todos os dias fugazes, pois essa é a tua porção na vida e em todo o teu trabalho sob o sol” (Ecl. 9: 9). Esse é o amor que cresceu da paixão para a responsabilidade e para a alegria existencial: a alegria de estar com alguém que você ama.

A mensagem essencial do judaísmo não está contida em nenhum desses livros, mas na combinação de todos os três. Eros é o fogo que dá ao amor a sua qualidade redentora, transformadora, dirigida para outros. O casamento é o vínculo da aliança que transforma o amor em uma garantia de lealdade e traz uma nova vida ao mundo. Companheirismo, experiência e uma vida bem vivida trazem simchá, uma palavra que aparece apenas duas vezes em Shir HaShirim, nenhuma em Rute, mas dezessete vezes em Kohelet.

Amor como paixão; amor como casamento e nascimento de filhos e continuidade; Amor como felicidade permanente: três fases do amor, traçadas no curso de uma vida e no curso de um ano e suas estações: Shir HaShirim na primavera, Rute na época da colheita, Kohelet no outono, quando os dias ficam mais frios e as noites mais longas . Com um maravilhoso toque de serenidade, Kohelet termina com o conselho: “Lembra-te do teu Criador nos dias da tua juventude, antes que venham os dias de problemas e os anos se aproximem quando você dirá: Não encontro prazer neles” (12: 1), levando-nos assim de volta à juventude, primavera e Shir HaShirim, onde começamos.

 

Texto original: “Seasons of Love” por Rabino Jonathan Sacks.
Tradução Rachel Klinger Azulay para a Sinagoga Edmond J. Safra – Ipanema

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